O Céu de Cuiabá é Mar do Rio – por Anna Maria Ribeiro Costa

[avatar user=”Anna Maria Ribeiro” size=”thumbnail” align=”left” link=”file”]Anna Maria Ribeiro Costa – Escritora Pesquisadora com pós-doutoramento em Ciências Sociais PUC/SP[/avatar]

Na madrugada do dia 21 para 22 de dezembro, das alturas, Loyuá e Igor avistaram Cuiabá. A cidade se esparramava como um enorme tapete com luzinhas tremeluzindo. No céu, ao contrário, nada piscava intermitentemente. A Lua Cheia, Lua Redonda no dizer do povo indígena Nambiquara, sozinha reinava. A abrir o solstício de verão, o dia mais longo do ano, o hemisfério Sul acha-se tendente na direção do Sol, a receber mais raios solares.

Na astrologia, o fenômeno do encontro Lua Cheia e solstício de verão significa que “as verdades estão plenas e tudo o que é verdadeiro pode se manifestar.” A raridade da ocorrência astronômica – energia do solstício em consonância com a Lua Cheia – nos presenteia com um grande momento de paz entre as pessoas.

Ao relacionar a beleza do céu de Cuiabá com o mar do Rio de Janeiro, suas duas cidades natais, Loyuá observa o céu em fenômeno tão raro com outro olhar. A conjugar o verbo “sulear” (entender o Sul a partir do Sul), experimenta o fenômeno com o sensorial, com seus referenciais.

Embevecida com a escuridão do céu, enfeitado com Lua Cheia, a receber as primeiras claridades do Sol que deixam nuvens em aquarela, não contraria os poetas mato-grossenses e tantos viajantes estrangeiros que estiveram sob o céu cuiabano a registrar emoções para além da astronomia. Lévi-Strauss, por exemplo, o professor francês que “detestou a Baía da Guanabara”, calou-se ao observar o céu de Mato Grosso nos anos de 1936-1938 e 1984.

Pelo povo Bororo, que nomeia astros e estrelas e com eles se direcionam, o céu de Cuiabá é observado diferentemente da percepção europeia, assim como fazem os demais povos indígenas. Merié o Sol. Arié a Lua. Merie Arisão irmãos poderosos e travessos. Merié o irmão mais velho, mais poderoso que Ari, seu reflexo. Juntos, responsabilizam-se para influenciar o modo de vida indígena Bororo. Suas aldeias são circulares e refletem as formas dos dois astros celestes mais proeminentes, que se alinham no eixo Leste-Oeste, acompanhando o percurso solar maior.

Para Loyuá, a Lua Cheia do solstício de Verão iluminou a imensidão do céu tal qual a imensidão do mar. Do céu de Cuiabá; do Mar do Rio. Que a previsão da astrologia para a raridade do encontro Lua Cheia-solstício de verão nos presenteie verdadeiramente com uma grande vontade de construção de paz entre as pessoas.

Feliz Natal!