CineCaos propõe afronta ao poder vigente através de cinema marginal

‘Cataclismas, Hecatombes e Delírios de Poder’ é o tema da Mostra 2019; Curadoria promete manifesto contra política nacional de cortes através de filmes atuais, com temáticas inusitadas e politicamente relevantes

Curta 'Janaína Overdrive', de Mozart Freire, foi exibido na última edição do Festival

A Mostra Internacional de Cinema e Audiovisual CineCaos – festival de cinema independente; de bordas; marginal; trash; underground ou seja lá como você queira chamar – chega à sua quinta edição consecutiva com a tema ‘Cataclismas, Hecatombes e Delírios do Poder’. As inscrições estão abertas desde segunda (15.04) e seguem até 15 de julho. Para se inscrever, basta enviar os dados da produção e o filme para o e-mail cinekhaos@gmail.com.

E além da mostra, que acontece na UFMT nos dias 10, 17, 24 e 31 de agosto, a abertura da programação (03.09) – na Casa Cuiabana – conta com shows das icônicas bandas GTW, Caximir, Nidog e Desert Punk. E também haverá oficinas, entre os dias 5 e 9 de agosto na UFMT, ofertadas por profissionais de todas as áreas cinematográficas. A ideia é que os participantes, durante este processo de aprendizagem, produzam um filme do gênero a custo zero. Por fim, durante todo o ‘mês do cachorro louco’, Camila Hybris expõe suas telas no Centro Cultural da Universidade. Trata-se da primeira mostra individual da artista plástica.

CINECAOS 2019

Para a seleção dos filmes que vão compor a mostra, além de só considerar obras que estejam fora do circuito comercial, a curadoria deste ano preza por filmes atuais, com temáticas inusitadas e politicamente relevantes.

Eliete Borges, que compõe a curadoria ao lado de Petter Baiestorf e Ivandro Godoy, explica que a intenção é selecionar aqueles “que fazem afronta ao poder vigente, a esses ‘delírios do poder’ anunciados na temática”. O termo citado faz referência ao livro homônimo da filósofa Márcia Tiburi, com quem Eliete afirma ter proximidade de pensamento.

‘Delírios do poder’, neste contexto, refere-se a lideranças de extrema direita, como Trump, Bolsonaro e Viktor Orbán, que “transformam o poder numa paranoia, numa coisa absolutamente centrada num conhecimento egóico”, explica.

Eliete os define como “radicalismos fascistas a se encarar”. E especificamente no caso brasileiro, pontua que foi declarada uma guerra contra o cinema, as artes e a cultura de um modo geral. E este confronto é materializado pelos “cortes de incentivos e patrocínios” promovidos pelo atual governo, o que acaba por podar “perspectivas de criação, produção, divulgação e circulação”.

“O CineCaos é uma resposta a essa guerra”. Porém, por se tratar de cinema underground, trash e marginal, este manifesto contra as políticas de corte se dá de uma maneira não convencional, afinal esta é uma característica intrínseca deste tipo de produção.

Neste sentido, a curadoria vai selecionar o que considera “filmes engajados politicamente”, porém “não no sentido da militância política, mas filmes que vão escarnecer desse poder delirante, desse poder autosabotador e completamente autoritário”.

E no que diz respeito aos outros termos que compõem o tema da mostra, “Hecatombes” se refere “a toda essa violência, essa carnificina atual”, elementos comumente trabalhados em produções do gênero. E ‘Cataclismas’ dialoga com essa “dimensão ambiental do planeta todo fodido”.

O QUE CABE NO CAOS

É importante ressaltar que esta temática serve apenas para orientar os participantes em relação aos critérios estabelecidos pela curadoria durante a seleção das obras, mas Eliete avisa que “dentro do caos cabe tudo. Absolutamente tudo. Desde filmes censuráveis, de classificação adulta, até tosquices, bizarrices e escatologias”.

Ela explica que o CineCaos não foca “numa definição especificamente do caos porque quer agregar produções que estejam fora do mercado comercial e que aborde temáticas inusitadas. Essa é a primeira perspectiva”, ressalta.

Não por acaso, no ano passado, o festival contou com três filmes estrangeiros (um chileno, um haitiano e um norte-americano), o que lhe garantiu o caráter de Mostra Internacional. E a intenção é que esse ano siga esta mesma tendência e, se possível, que estas fronteiras sejam cada vez mais esmiuçadas.

“O que a gente quer é buscar os filmes que mostram o que há de improviso, experimento, invenção e de caótico na vida e na produção do cinema e do audiovisual”, definiu Eliete em um texto escrito para o Cidadão Cultura em 2016.

A HISTÓRIA DO CAOS

A ideia do CineCaos surgiu de maneira despretensiosa, num papo de boteco entre amigos amantes do cinema. Eles perceberam que não havia uma programação específica reunindo os gêneros fílmicos que hoje compõem a mostra, de modo que eram obrigados a assistir essas produções sozinhos em suas casas.

Portanto, além de reunir essa galera, a proposta inicial do festival consistia em apresentar este tipo de cinema àqueles que não tinha contato com o mesmo. “A intenção era atingir um público que comumente não via cinema independente, de bordas, marginal, trash e underground”.

Eles também constataram se tratar de uma produção muito abundante, porém que não conseguia encontrar espaços nas salas dos cinemas tradicionais e muitas vezes nem em festivais, afinal de contas é um produto que rompe com os padrões tradicionais de ensino e feitura de cinema.

Enfim, cientes das potencialidades e limitações do gênero, criaram o festival. A primeira edição, em 2015, contou com apenas 13 filmes. E apesar de não ter essa pretensão, Eliete relata que o CineCaos sempre teve uma projeção excelente no sentido da crítica.

Desta maneira, o festival foi crescendo nos anos seguintes. E já na sua 4ª edição, em 2018, recebeu inscrição de 60 filmes, sendo que 39 foram selecionados pela curadoria para compor a mostra, que, além das sessões, já contava com palestras, oficinas, performances, exposições de artes plásticas, dentre outras atividades.

No entanto, tal qual o cinema independente que se faz à base de muito suor e quase nenhuma grana, o CineCaos segue esse mesmo padrão do chamado “cinema de guerrilha”. “A gente não tem financiamento, não tem patrocínio, não tem apoio, não tem lei de incentivo, não tem acesso a editais, porque esse é um festival que foge dos padrões comercializáveis”, conclui Eliete.

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