Grupos teatrais se unem em intervenção urbana que questiona a justiça

A intervenção/performance “A Justiça Dos Poderes A Mim Conferidos” resulta de longa pesquisa e reúne o Theatro Fúria e o Coletivo Coma a Fronteira

Caio Ribeiro, Carolina Argenta e Péricles Anarckos durante a performance

Quem controla a justiça? Este questionamento, mais contemporâneo do que nunca (embora provavelmente nunca deixará de ser contemporâneo), permeia a intervenção urbana “A Justiça Dos Poderes A Mim Conferidos”, que será apresentada, a partir das 22h deste sábado (29.06), pelo Theatro Fúria em parceria com o Coletivo Coma a Fronteira. O local escolhido obviamente é a rua, mais especificamente a Rua do Meio, em frente ao Leviana Bar, localizado na tradicional Praça da Mandioca.

A performance conta com as atuações de Péricles Anarckos, Carolina Argenta e Caio Ribeiro. O popular arquétipo de justiça é representado por Carolina. A apresentação reflete sobre a função, a importância e a posição da justiça nos dias atuais. A quem e a que serve esta figura feminina de olhos vendados que segura uma balança e uma espada?

De acordo com os artistas envolvidos na intervenção, a justiça tem muitas facetas.  O senso comum, por exemplo, tendo a enxerga-la como um ser incorruptível, que tem o discernimento ideal para conseguir fazer o melhor juízo das coisas.

Todavia, pondera o grupo, “o acesso à justiça está associado a um sistema gigantesco, marcado por pessoas, leis e burocracias. Todo esse sistema conseguiu fazer com que a justiça caminhe conforme caminham aqueles que conseguem se apropriar deste sistema”. Neste sentido, a intervenção coloca em questão a figura da justiça considerada indispensável em uma democracia.

PESQUISA E EVOLUÇÃO

A pesquisa a respeito desta performance se iniciou em 2016 em intercâmbio do Theatro Fúria com a Cia Aqueles Dois. Estreou no Revirado Cênico do Palco Giratório daquele mesmo ano e foi apresentada no Festival de Monólogos e Breves Cenas de Vilhena, em 2017.

Desde então, este arquétipo de justiça em suas mais variadas formas e culturas, considerando a relação com seus intrínsecos privilégios, tem sido fonte de pesquisa e experimentações de Péricles e Carolina (Theatro Fúria) juntamente com o multiartista Caio Ribeiro (Coma a Fronteira).

JUSTIÇA EM CENA

O conceito de justiça é um tema muito caro ao Theatro Fúria. Em quase todos os espetáculos, às vezes de forma mais sutil, noutras mais contundente, a questão é levantada. Em 2017, por exemplo, ao lado da Cia Aqueles Dois (Thaisa Soares e Umberto Lima), eles apresentaram “Confissões de um Amor Caboclo”, com dramaturgia e direção do próprio Péricles.

Na trama, a dona de um jornal tem de optar entre apoiar um entre dois partidos: o que lhe trará prosperidade ou o que lhe trará o sentimento de justiça. Na encenação da peça, uma das cenas inclusive chama atenção pela proximidade estética com a intervenção “A Justiça Dos Poderes A Mim Conferidos”.

Proximidade estética entre as duas obras dirigidas por Péricles Anarckos

E mesmo nos primeiros trabalhos, há aproximadamente duas décadas, situações relacionadas ao tema já se faziam presentes na obra furiosa, como na primeira e premiada peça do grupo, “Nepal (1999)”, em que os dois últimos sobreviventes da Terra são justamente dois cidadãos condenados à morte.

A peça seguinte, “Encaixotando Shakespeare (2002)”, apresenta uma espécie de julgamento onde o “réu” é o próprio Shakespeare e os “acusadores” são alguns de seus clássicos personagens, todos fadigados de seus próprios desfechos trágicos repetidos ao longo dos séculos.

Espetáculos mais recentes, como “O Pirata e Deus” e “Tramando Esopo”, ambos de 2018, também abordam o tema. No primeiro, o texto apresenta dois irmãos siameses, um inocente e outro culpado, que seguem impunes porque, segundo a filosofia do Direito, neste caso, é imoral punir o inocente quando se pretende condenar o culpado.

A moral, conceito que serve de premissa na fundamentação das leis, também é uma questão em “Tramando Esopo”. Esopo, por sinal, é conhecido como “pai das fábulas com lição de moral”, não por acaso a dramaturgia do Theatro Fúria, na releitura das histórias de Esopo, optou por suprimir esta característica para não reproduzir fábulas moralistas.

Por fim, segue um pensamento em forma de poema concebido justamente para a intervenção urbana “A Justiça Dos Poderes A Mim Conferidos”:

A todos os petulantes
que há muito tempo têm rido
toda a vez que da existência
da Justiça têm ouvido
destino este recado:
Vamos fazer percebido
os poderes da Justiça
e a quem foram conferidos.

INTERVENÇÃO URBANA

Intervenção urbana é a intervenção no quotidiano de uma cidade. Algo que existe para causar estranhamento, chamar a atenção e sugerir interpretações a respeito do que se faz na intervenção, geralmente com o intuito de provocar a reflexão aos frequentadores do espaço urbano. É uma maneira de fazer a cidade respirar, propondo uma ação, movimento ou manifestação num espaço onde geralmente as pessoas apenas repetem uma rotina.

Ficha Técnica:

Concepção: Theatro Fúria
Direção: Péricles Anarckos
Figurino: Theatro Fúria e Coma a Fronteira
Artista convidado: Caio Ribeiro
Sonoplastia: Carolina Argenta
Produção: Carolina Argenta

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