Leila Pinheiro evidencia belezas e bossas da música de Antonio Adolfo e Tibério Gaspar

Em disco dividido com o pianista, cantora mostra que as toadas dos compositores ainda continuam modernas como no período 1967-1970.

Foto: Leo Aversa / Divulgação

Genericamente rotulada como “toada moderna”, a obra construída entre 1967 e 1970 pelos compositores cariocas Antonio Adolfo e Tibério Gaspar (11 de setembro de 1943 – 15 de fevereiro de 2017) fez jus à modernidade lhe carimbada por embutir bossas e harmonias de jazz em canções bafejadas por belezas melódicas e poéticas.


Antonio Adolfo | Sá Marina (Antonio Adolfo e Tibério Gaspar) | Instrumental Sesc Brasil

Com lançamento programado pela gravadora Deck para sexta-feira, 13 de março, o álbum Vamos partir pro Mundo – A música de Antonio Adolfo e Tibério Gaspar cumpre bem a missão de resgatar e lapidar, na voz de Leila Pinheiro, joias de cancioneiro que estaria totalmente esquecido, não fossem os hits Sá Marina (1968), Teletema (1969) e BR-3 (1970) – tripé que sustenta a obra da dupla na memória popular.

O êxito do álbum é resultado da união de Antonio Adolfo com Leila Pinheiro. Por ser pianista de mão cheia e por ser o melodista das 15 composições alinhadas no disco, Adolfo tem toda autoridade para redesenhar acordes e burilar o cancioneiro. Já Leila é cantora de rigores técnicos que, embora por vezes abafe o sentimento da voz, se mostra perfeitamente talhada para reinterpretar as 15 músicas de Adolfo e Gaspar.

Título obscuro da parceria, gravado por Adolfo com o conjunto A Brazuca para disco editado em 2007 por selo inglês, Dono do mundo abre o álbum com todo o esplendor melódico e harmônico de bonita canção que merece ser mais conhecida. Glória Glorinha (1970) também sobressai no álbum com bossa sedutora que flui muito bem no canto de Leila.

Tema da trilha sonora do filme Ascensão e queda de um paquera (1970), Cláudia também reverbera, com menor encanto, a bossa carioca misturada pelos autores com ecos do cancioneiro do compositor norte-americano Burt Bacharach, então em grande evidência mundial.

A luxuosa presença de Roberto Menescal como músico do álbum, tocando violão e/ou guitarra em 14 das 15 faixas, contribui para manter a leveza exigida pela atmosfera de músicas como Domingo azul, tema incrementado no disco com as cores rítmicas do ijexá.

Tal como Dono do mundoDomingo azul é música quase desconhecida do cancioneiro de Adolfo e Tibério por ter sido apresentada no álbum Destiny (2007), gravado por Adolfo com A Brazuca e lançado na Europa por selo inglês sem nunca ter sido editado no Brasil.

Com a tarimba de ser também instrumentista, hábil no toque do piano, Leila Pinheiro aquece no mesmo fogo brando tanto a efervescência rítmica da marcha-frevo Alegria de Carnaval (1967) como a bossa serena que pauta a canção-título Vamos partir pro mundo (1970), último título da produtiva safra da parceria no período 1967-1970.

Leila é cantora segura o suficiente para encarar até Sá Marina (1968) com a consciência de que ninguém caiu no suingue dessa música com a desenvoltura de Wilson Simonal (1938 – 2000). Tanto que a bossa maior da faixa é o solo da gaita de Gabriel Grossi, convidado a evocar o som de Stevie Wonder, intérprete que projetou Sá Marina no exterior com a gravação da versão em inglês intitulada Pretty world (1971).

Com a mesma segurança com que canta Sá Marina, Leila percorre a estrada turva que pauta a melodia de Teletema (1969) – cuja letra descreve as sensações de Tibério Gaspar diante da morte de namorada do compositor – sem anular os registros emblemáticos de Regininha (intérprete original da música propagada na trilha sonora da novela Véu de noiva, estreada na TV Globo em 1969) e de Evinha.

Primeira composição da parceria de Adolfo com Gaspar, Caminhada (1967) exemplifica a maestria de Antonio Adolfo ao rearranjar o cancioneiro da dupla com doses adicionais de refinamento. Caminhada é refeita por Leila com toques de baião, ijexá e “outras bossas”, como caracteriza Adolfo no detalhado texto de apresentação do disco.

Uma das bases dos arranjos, o piano de Adolfo – tanto o acústico como o elétrico Rhodes – arma cama confortável para Leila Pinheiro rodopiar nos contornos rítmicos de Giro (1969). Música da safra de 1967, popularizada por Maysa (1936 – 1977) em gravação de 1969, Tema triste é veículo para Leila expor emoções depuradas em sintonia com a melancolia de A cidade e eu (1969), dando a este tema a devida introspecção, diluída na gravação original pela pegada pop da banda A Brazuca.

Música composta para a trilha sonora da novela Pigmalião 70 (TV Globo, 1970), Ao redor gravita com contemporaneidade por conta das harmonias requintadas criadas por Adolfo para o disco. Traçando percurso ensolarado na letra imagética, Pela cidade (1970) também se mostra sedutora para ouvidos habituados ao requinte da MPB dos anos 1960 e 1970.

No fim da caminhada, guiada por Adolfo, Correnteza (1969) confirma o acerto desse passeio de Leila Pinheiro pelas bossas e belezas melódicas e poéticas das toadas ainda modernas de Antonio Adolfo e Tibério Gaspar.

Fonte: G1

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