Autores de Cuiabá lançam selo independente ‘Arcada’ e preparam publicação de quatro livros

Por Túlio Paniago

Sem auxílio de editais, leis de incentivo e tampouco atrelados a qualquer editora. Genuinamente independentes. É desta maneira que quatro autores de Cuiabá vão lançar seus livros. O principal e único apoio eles encontraram uns nos outros, como os dentes de uma boca, que, embora sejam únicos, revelam suas potencialidades e belezas em conjunto, tanto no sorriso quanto na mordida. E, não por acaso, o grupo de autores batizou de “Arcada” este selo coletivo recém-criado, que foi sintetizado em poucas palavras como “o tratamento de canal para autopublicações”.

Os quatro idealizadores, Lorenzo Falcão, Júlio Custódio, Danilo Fochesatto e Rodrigo Meloni, já têm data e lugar definidos para o pré-lançamento de seus respectivos livros. O evento está marcado para o dia 16 de março no sebo Raro Ruído. É tudo à base do ‘faça você mesmo’, desde o conteúdo, passando por projeto gráfico e diagramação, até finalmente chegar ao site, mídias sociais e estratégias de divulgação e lançamento.

“Surgiu da necessidade de produzir e botar na rua”, resume Fochesatto, um dos autores e idealizadores do selo. Este pensamento dialoga de forma certeira com um verso do músico Sérgio Sampaio: “Um livro de poesia na gaveta não adianta nada / Lugar de poesia é na calçada”. E falando em livro de poesia, duas das obras são pertencentes ao gênero: “Distribuidora Falcão – versos no atacado e varejo (L. Falcão)”; e “Você derrubou coisas pelo caminho (J. Custódio)”. Enquanto “Lá, onde uma porta jamais parou de bater (D. Fochesatto)” e “Coitado do homem cujos desejos dependem (R. Meloni) são pertencentes ao gênero conto, sendo o primeiro livro uma coletânea e o segundo um único conto mais extenso.

A proposta do selo é dar continuidade às publicações, agregando novos dentes à Arcada. “A gente espera financiar livros de mulheres para a próxima, inclusive já estamos procurando algumas autoras”, revela Fochesatto, e acrescenta acreditar que parte das vendas destas quatro primeiras publicações possam ajudar a financiar futuras edições.

CRISE NO MERCADO EDITORIAL

No entanto, estão careados de saber sobre a grave crise do mercado editorial brasileiro, na qual livrarias estão declarando falência por falta de consumidores para seus produtos, em outras palavras, leitores para os livros. E até gigantes como Saraiva e Cultura já entraram com pedido de recuperação judicial. Apesar de desolador, este contexto não intimida o pessoal do Arcada, até porque estão seguindo num sentido inovador e acreditam, assim, viabilizar novas possibilidades.

“Nosso esquema é fazer de tudo para que o livro chegue barato ao consumidor final. Além disso, e pelo fato de sermos independentes, podemos criar novos mercados e mecanismos para atingi-los”, explica Fochesatto, antes de concluir que “a crise de uns pode ser um bom negócio para outros”.

OS DENTES DA ARCADA

Cada obra terá uma tiragem de 500 exemplares e estarão disponíveis, a princípio, no Sebo Raro Ruído. O valor não será o mesmo para todos, afinal são diferentes, e vão custar entre R$ 15 e R$ 20.

“Distribuidora Falcão” é o quinto livro da carreira do jornalista e multiartista Lorenzo Falcão, imortal da Academia Mato-grossense de Letras, que se mostra tão feliz como se estivesse publicando o primeiro: “Felicidade é publicar minhas letras acompanhado por amigos, pessoas próximas acometidas pelo vício da palavra, que nem eu. E assim a gente vai vivendo e tropeçando nessa vocação que é transtornar a realidade do verbo nosso de cada dia”.

Quem de fato está lançando sua obra de estreia é o jornalista, articulador político, ativista gay e estudioso da comunicação de massa Rodrigo Meloni. “Coitado do homem cujos desejos dependem” é composto por um único conto sobre o personagem Diego Herculano. “É a história de sua trajetória, calcificada de dor, desespero, carinho, amor, vingança. Todos os ingredientes que nos formam estão ali. É rio que corre nas veias da vida. Assim como Herculano, este livro é um pouco ternura e um tanto cólera”, revela o escritor.


Em “Lá, onde uma porta jamais parou de bater”, Danilo Fochesatto nos brinda com um poema e trinta e um contos, coletânea garimpada ao longo de mais de uma década, de modo que, segundo o autor, o estômago de quem lê encontrará a porção comestível de sua produção literária, inédita ou não. E ele também desaconselha o uso de guardanapo de papel, pois as palavras devem sujar a boca de quem as mastiga. Portanto, alimente-se, literalmente, sem talheres.

Por fim, Júlio Custódio, tal qual sugere o título de seu livro, você, enquanto poeta e filósofo, derrubou coisas pelo caminho, como este poema que não encontra lugar para se encaixar neste texto jornalístico:

“perceba o animal de estimação
foi preciso ele arranhar a porta
reclamar numa língua esquecida
e dormir sem roupa na frente de todos
eu vi você olhando

vi você em uso no passeio público
junto a vossa bondade
derrubando coisas pelo caminho
me pareceu o certo a se fazer
devolver sua antiga prataria

não estranhe, nada aqui é meu”

(Trecho do prefácio do livro ‘você derrubou coisas pelo caminho’, de J. Custódio)

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